quarta-feira, julho 05, 2006

O QUE É KI?

Entrevista com Yoshigasaki sensei 8º dan
Instrutor Chefe da Ki no Kenkyukai, Europa


O qué Ki?
Ki é uma palabra japonesa, que se escreve com caracteres chineses, por isso tem um significado chinês e outro japonês, e esses significados são muito diferentes e acabaram criando muita confusão. O significado da palavra em chinês – suponho que a pronuncia seja algo assim como Qi, ou algo parecido -, deveria-se perguntar ao povo chinês, mas como eu sou japonês, prefiro utilizar a palavra Ki de modo japonês, que significa algo assim como algo que não está claro, que não pode ser definido. Na vida diária pode significar sentimentos, sensações ou emoções ou idéias, as quais não estão todavia claras mas o estarão mais adiante. Ou alguma motivação, etc, etc. É por isso que entender Ki é muito importante, no sentido que esse é um processo de compreensão de nossa própria vida e de compreensão de nós mesmos.

Sensei, senhor tem um método específico de ensinar as turmas de Ki e outro diferente para as de Ki-Aikidô?
Ensinar as turmas de Ki é praticar as noções básicas. Mas a questão é que a prática de Ki se realiza na vida diária, o que é difícil mas é a única maneira. É por isso que eu pratico Ki-Aikidô, é o significado de porque nós utilizamos os princípios do Ki para a prática física desta arte marcial: o Aikidô, com ele as pessoas obtém um bom exercício e a prática do Aikidô se pode integrar à vida diária e desta forma é muito mais fácil para as pessoas continuar a prática durante mjuito tempo. Outra razão é que praticando as técnicas de Aikidô, certas coisas do Ki são muito mais fáceis de explicar e entender. Por isso eu realmente penso que o Ki-Aikidô é uma muito boa forma de praticar Ki.

Quando falamos sobre Ki, isso seria como a parte oculta das artes marciais como o Aikidô. Poderia nos dar algum exemplo de desenvolvimento não marcial às pessoas?
A pratica do Ki é boa para todas as pessoas do mundo mas a questão é que em um nível superficial é muito fácil de ser alcançada por muita gente. Mas sempre que se quer chegar a um nível mais profundo você precisa viver com isso, esta é a dificuldade. Normalmente as pessoas necessitam de uma atividade física que poderia ser o Yoga, Taichi ou uma terapia, realmente não é importante qual é. O que realmente é importante, é que as pessoas podem usar os princípios do Ki em suas atividades físicas. É por isto que o Aikidô é bom, mas, se outras pessoas usam os princípios do Ki em sua vida cotidiana, também está bem.

Sensei, o senhor explicou a diferença entre as turmas de Ki e de Ki-Aikidô, mas poderia especificar, em um sentido básico, por quê o senhor está ensinando Ki de todas as formas?
O motivo do porque ensino Ki é porque ninguém mais o faz. Este é basicamente o motivo. Mas, atualmente, em casa, me pergunto o porque de eu ensinar. Quando ouço a outros professores ensinando, muitas vezes sem sentido ou com erros, ou quando vejo livros de meditação, muitos deles estão repletos de sem sentidos. Por isso, minha motivação é dada porque há muitos professores incapacitados no mundo, e alguém deveria ensinar da forma correta. Esta é a única motivação de meu ensinar.

Poderia dar-me uma definição de ciência, e também uma indicação do que a ciência está fazendo a nossa sociedade?
A ciência original remonta aos tempos gregos. Suponho que na época dos gregos a ciência era a inverstigação da Natureza, o Universo, os seres humanos, etc. e isso continua até o século XV, antes da revolução industrial. Os cientistas eram ao mesmo tempo artistas, como Leonardo da Vinci, etc., e filósofos, deste modo visto tudo está conectado. Mas, então, após a revolução industrial, na Inglaterra, a ci~encia tornou-se muito material, porque se podia utilizar a ciência com o propósito do progresso material e da industrialização. Assim, após isso, a revolução industrial científica chegou a ser muito materialista, o que não é tão bom para a vida, já que a ciência material está baseada no princípio material. Atualmente as pessoas estão começando a utilizar a ciência para a vida, porque, claramente, nos últimos digamos 20 ou 30 anos temos visto que o progresso material não é suficiente. Então, quando os professores das universidades que procuram entender a vida humana com a ciência chamada ciência humana ou algo completamente equivocado. Deste modo que esses erros estão fazendo danos e criarão muitos mais em nossas vidas. Este é porque meu propósito é propor algo que possa substituir a ciência material; significando com algo, algo que tenha uma estrutura tão boa como a ciência.

Sensei, o que significa "Shin Shin Toitsu", e “unidade de mente e corpo”. É o mesmo que coordenação de mente e corpo? O que é mente e o que é espírito?
Ambos, unificação de mente e corpo, ou unidade de mente e corpo, e coordenação de mente e corpo são traduções de palavras chinesas ou japonesas, de modo que são a mesma coisa. Essa unificação de mente e corpo, eu não sei que começou essa idéia; quiçá las pessoas do zen ou os chineses, eu não sei. Mas essa unificação de mente e corpo é apenas uma parte do que estou ensinando. É um bom conceito, mas não é tão importante.
A mente é um conceito: algo que move o corpo. Esse é o conceito normal de mente. Espírito é uma palavra religiosa, assim, eu realmente nunca uso a palavra espírito. Para mim, espírito é uma palavra para as pessoas religiosas, que crêem em Deus.

Seguindo com o que o senhor acaba de explicar, poderia dar-me uma definição da palavra meditação?
A palavra meditação é também um vocábulo inglês, e realmente não sei quem o inventou. Não posso encontrar nenhuma palavra japonesa que corresponda com meditação, assim que é uma coisa que eu não sei muito bem. Digamos que é uma palavra conveniente para descrever certas atividades com as quais podemos intentar entender nossa própria vida em relação com o mundo. Assim, de alguma forma, eu uso a palavra meditação para significar que as atividades se unificam com a vida e estes com o mundo inteiro.

Sensei, Ki e respiração parecem seguir juntos. Por quê é assim, e há uma razão para que, em geral, muitos de nós respiremos inadequadamente?
Ki, é algo que não está claro, mas chega a estar claro mais tarde. Mas a maioria das pessoas respirar é também Ki, porque a maioria das pessoas não é consciente de sua própria respiração. Algumas vezes a respiração chega a parecer estar perturbada, sem que as pessoas se dêem conta disso; deste modo praticar o Ki na vida diária é um caminho para conhecer nossa própria respiração. Mas, então, para fazer isso, é preciso entender também a prática da respiração como uma prática básica do diafragma, o qual, deve mover-se bem. Esta é a pra´tica básica. E então, depois disso, fazemos a pratica de não respiração, o que significa que você deve conhecer sua própria respiração.

Segundo o que eu pude sentir em mim mesmo, uma respiração melhor tem muitas implicações. Há algo mais a dizer sobre as conseqüências físicas de uma boa respiração? O que pode dizer sobre a relação entre respiração e emoções e consciência?
A influência de uma boa respiração para a saúde, bem, suponho que uma boa respiração ajude a manter uma boa saúde. Não tenho as estatísticas, mas espero que seja desse modo. Para a parte emocional também. Muita gente não se dá conta quando respiram de forma incorreta. Evidentemente, quando você respira mal tuas emoções se perturbam. Realmente, não há problemas com as emoções, apenas com as perturbadas, o que faz com que a respiração, por sua vez, seja perturbada. DE modo que, praticando boa respiração, tuas emoções chegam a ficar claras e imperturbáveis. Então você perceberá que ter emoções é bom, e de alguma forma todas as emoções são belas.

O que é emoção?
Emoção é um movimento do corpo provocado ou relacionado com o movimento do diafragma.

Poderia nos dar uma idéia do significado funcional das emoções? Por que temos emoções?
Não sei o porquê, mas quase sempre que percebemos algo exterior a nós temos uma reação. Quando essa reação não é harmoniosa, então a parte que não é harmoniosa deve expressar-se pelo movimento do corpo. Por ele, ter emoções é muito bom, sempre. O único porém é quando você está respirando de forma incorreta e o diafragma não se move corretamente, então o movimento interior não é harmonioso e não é bom para o corpo. Se as emoções beneficiam o corpo está bom, mas a realidade para muita gente é que as emoções molestam o corpo, e esse é o problema.

Poderia nos dar alguma idéia de consciência; o que é consciência? O senhor vê alguma melhora da consciência graças à prática da respiração Ki ou de prática de Ki?
A palavra consciência é uma palavra que quase não utilizo porque não entendo realmente seu significado. Portanto não posso responder a pergunta. Mas posso dizer porque não utilizo a palavra consciência. Estar consciente significa que você percebe algo que antes não percebia. Portanto, é impossível praticar a consciência porque você nunca pode praticar o estar consciente de algo. Por isso que quando tua mente está livre, então há uma possibilidade de que você possa estar consciente de coisas novas. É por isso que nunca uso a palavra consciência quando ensino as pessoas.

Desculpe, não entendi sua definição de consciência.
Estar consciente de algo significa perceber algo que não se percebia antes. Isso é um descobrimento. É por isso que não podemos praticá-lo, porque não podemos praticar o descobrimento. Podemos descobrir apenas quando a mente está livre, assim, a prática consiste em manter nossas mentes livres.

Sensei, muitas vezes eu o tenho ouvido explicar que as turmas de Ki são para nosso próprio desenvolvimento, e que a meditação é algo mais que terapia. De que modo pode uma turma de Ki ser interessante para um terapeuta? Poderia um terapeuta chegar a ser um mestre de Ki? Esse é o sentido da palavra setsudo?
Em primeiro lugar, a prática de Ki é para nossa própria vida, sendo que as pessoas interessadas na terapia estão principalmente interessadas em curar outras pessoas, portanto estão interessadas em outras pessoas. Mas, então, a técnica para fazer algo para outras pessoas, tratar com outras pessoas, e a técnica de tratar consigo mesmo são diferentes. É por isso que eu sempre digo que esta meditação, ou a prática de Ki, não é terapia. Explicar isto é especialmente importante para ver a diferença entre meditação e psicologia. Assim deixo sempre claro para que as pessoas não usem a meditação como uma psicoterapia.
E então, setsudo, é uma palavra japonesa que não sei quem começou a usa-la. Significa ensinar a verdade.
Há dois tipos de mestres. O mestre que ensina técnicas que de algum modo são boas para todas as pessoas. Realmente a maioria dos mestres são assim, especialmente os mestres dos colégios. No entanto, este mestre de meditação é diferente no sentido de que a meditação é o que vejo em minha vida. Eu conheço minha vida, mas nunca pude saber se o que é bom para minha vida é bom para as outras pessoas. O mestre de meditação só sabe o que é bom para si mesmo, mas não sabe se é bom para todos. Portanto, espero que o é bom para mim o seja para todos os outros, mas nunca posso estar seguro disso. É por isso que, em meditação, nunca forçamos ninguém a fazer algo, simplesmente sugerimos e se lhes parece bom, o fazem. Mas as pessoas não o fazem sob a própria responsabilidade. De outro modo, os outros tipos de mestres que ensinam o que é bom para as outras pessoas, devem ter bastante experiência para conhecer as pessoas e o que é bom para elas. Esta é a diferença entre os dois tipos de mestres. Mas a maioria dos mestres são do segundo tipo, quero dizer, mestres que ensinam coisas boas para todos.

Nos ditos de Ki se faz menção à unificação de mente e corpo. O que se deduz é que todas as pessoas têm um grande poder que nem sempre está disponível. Poderia explicar um pouco mais o que quer dizer com poder? Para muitas pessoas, as turmas de Ki todavia se relacionam com pessoas saudáveis e com artes marciais. Poderia dar-me alguns exemplos de pessoas comuns ou pessoas mais destacadas que não têm habilidades físicas especiais?
É muito difícil, na realidade. Há um problema com a tradução. Este poder significa a habilidade para criar mudanças na vida. Por exemplo, se você está doente e cura a si mesmo, uma pessoa doente se converte em uma pessoa saudável, isto é poder. Ou se você tem um grande problema e o soluciona, isto é poder. Se todos estão nervosos e você está calmo e sereno, isto é poder. Deste modo, qualquer coisa que provoque mudanças na vida é poder. Portanto, entendendo os princípios da mente e entendendo os princípios do corpo você pode criar maiores mudanças na vida. Isto significa que você tem mais poder, este é o significado. Por isso você precisa entender o princípio de unificação da mente e do corpo.

Também já fiz esta pergunta ao senhor porque no livro “Ki na vida diária”, de Koichi Tohei sensei, o que mais surpreende a todos é uma fotografia sua: seus calcanhares em uma cadeira, a cabeça em outra e três pessoas sentadas em seu abdômen. Isso é muito próximo da magia, para muitas pessoas. Mas, do mesmo modo, também sugere algum poder físico. Por que se utiliza esse tipo de exemplo no livro?

Na realidade não sou eu, é um livro de Tohei sensei. Há duas coisas. Desde que ele começou com o Aikidô, ele tinha experiências com pessoas que praticavam Aikidô, isso significa que eram pessoas que não estavam interessadas em exercícios intelectuais. Deste modo, com gente desse tipo é fácil utilizar exemplos físicos. E também a cultura japonesa não aprecia a lógica com as palavras, muito mais a ação com o corpo. Desse modo, se você quer alcançar o japonês é melhor expressar-se com um corpo potente e não tanto com uma mente poderosa ou uma palavra poderosa. É uma questão cultural. Compreendo muito bem que esse método não é bom para os europeus.

Poderia dar um exemplo claro de ensinamento de Ki para os homens e mulheres europeus?
Os japoneses de uma solução para o problema de ensinar. Eles simplesmente expulsam os pensamentos e fazem algo fisicamente. Assim, de certo modo essa é a tradição japonesa: é por isso que eles propõem métodos físicos. Os europeus tratam de seguir pensando e resolvendo com os pensamentos; é por isso que eu acredito que é melhor para os europeus utilizar palavras e explicar muito bem as coisas. Além disso, creio que é bom para os europeus, porque devem ter uma solução com as palavras, não apreciam expulsar de si os pensamentos.

O senhor também começou, tempos atrás, com a prática de Ki. Poderia dar-me uma idéia o que pensou sobre como isso influenciaria sua vida diária?

Em minha vida diária nada porque eu comecei, digamos, por curiosidade, porque era mais como uma busca. Para mim é como fazer uma investigação científica. Eu investigo para a vida.

O senhor gosta de seu trabalho?
Sim, sim.

Quando o senhor ensina KI-Aikidô muitas vezes utiliza o conceito de gravidade para explicar e guiar o movimento. Poderia explicar porque a gravidade é tão importante para todos nós?
A gravidade não é importante. Só quando se faz técnicas de Aikidô é importante. No entanto, mesmo para pessoas que não praticam Aikidô, é importante entender a gravidade. Muita gente tem um conceito equivocado da gravidade, e com esse conceito equivocado criam erros na vida diária. Essa é a única razão porque ensino esse “manter o peso embaixo” nas turmas de Ki, para as pessoas que não praticam Aikidô. Para as técnicas de Aikidô está claro que é muito importante.

Isso é tudo. Muito obrigado, sensei.

(Entrevista realizada por Aragonen Holanda, em 1996)

Entrevista com Koichi Kashiwaya sensei (segunda parte)

(continuação – parte 2)

Na época Tohei Sensei também mantinha uma turma de Ki no Yoyogi Olmpic Center. Não era uma turma muito grande, cerca de 14 membros, altos executivos ou pessoas do tipo, em sua maioria. Não eram praticantes de Aikido nem de outros grupos de Aikikai. Mais tarde, fiquei sabendo que Tohei Sensei havia dito a Kisshomanu (Ueshiba) Sensei que ele gostaria de ensinar Ki no Aikikai, mas que as aulas seriam fora do Aikikai. Assim, eu era o único colegial a estar ali. E como era o mais jovem, senti que deveria ajudar. Chegava lá meia hora mais cedo e ajudava Tohei a arrumar tudo. Eu não desempenhava o papel de otomo, nada disso, só queria ser útil. A partir daí, Tohei Sensei passou a me reconhecer, pois eu chegava mais cedo e era o mais jovem de todos.

Ocasionalmente, ele me pedia para mostrar alguns dos arremessos do Aikido e como eu era o único com treinamento em Aikido ele me arremessava. Foi naquela época em que eu, pela primeira vez, treinei ukemi com ele.

Gradualmente, a Ki Society acrescentou mais turmas, e pessoas mais jovens começaram a chegar do Aikido – a maioria do Aikikai e alguns do Yoshinkan. A maioria dessas pessoas não tinha qualquer tipo de ligação com qualquer professor do Aikikai. De minha parte, sem ter muitos vínculos com o Aikikai, costumava freqüentar, de todo o jeito, para praticar e participar das aulas de Kisshomaru Sensei e outras aulas de instrutores seniores. Eu não me sentia na obrigação de seguir apenas Tohei Sensei. E as coisas aconteceram desse jeito.
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AW: O senhor acredita que a ruptura de Tohei Sensei com o Aikikai foi inevitável?

KK: Para mim, isso está feito e é fato consumado. Tohei não costumava puxar conversa sobre isso. É claro que toda a vez que há mais de duas pessoas reunidas, você tem um evento político. É da natureza humana. Eu não posso evitar a política, por suposto, mas também não gosto muito de ouvir a respeito. Para mim, torna-se uma espécie de violência se houver exagero. Creio que somos uma espécie de "caixa de ressonância" (risos) Todo o tipo de deshi (aprendiz) tem que ouvir qualquer coisa que o professor disser. É parte do nosso dever. Assim para mim, se Tohei Sensei tivesse alguma coisa para me dizer, minha obrigação era somente ficar ali e ouvir.

AW: Quando o senhor veio aos Estados Unidos?

KK: Tohei Sensei me pediu para ir a Seattle em 1973 por dois anos para ajudar o instrutor chefe Yoshihiko Hirata Sensei. Depois de dois anos, ele me perguntou se eu queria ficar nos Estados Unidos ou voltar ao Japão e tornar-me seu Uchideshi. Eu regressei ao Japão para o treinamento de Uchideshi por dois anos. Após esses dois anos, pedi para voltar aos Estados Unidos. Ele atendeu e sugeriu que eu fosse a Boston ou Chicago. Eu achava que qualquer lugar para mim estaria ótimo, com exceção daqueles lugares em que ele já havia estado (risos).

O que quero dizer é que se eu fosse aonde Tohei Sensei já havia estado, não seria bom, porque sua influência já estaria lá. As pessoas que tinham treinado com ele o veriam como professor e eu não queria interferir. Mas, Tohei Sensei não podia ir a todas as partes e conclui que minha missão era ir aonde ele não havia estado. Assim, talvez, eu pudesse ser um tipo de agente de Tohei Sensei.

Eu conhecia um instrutor de Judô em Boulder, Colorado, que havia estudado com Tohei Sensei. Eu o contatei e ele disse: "Claro, venha para cá". Foi assim que eu cheguei a Boulder em 1977.

AW: Como foi iniciar o Aikido em Boulder?

KK: Por sorte, já havia lá um dojo de jujutsu e judô que eu podia usar. Mas eu não queria tirar seus estudantes. Comecei com apenas uma pessoa. E também havia a limitação que eu não poderia manter muitas aulas porque eles usavam o dojo a maior parte do tempo. Eu tinha os domingos e as primeiras horas da manhã algumas vezes por semana. E era tudo . Então, alguns dos estudantes de judo e jujutso começaram a vir também. Eu conversei com seus instrutores e disse que não queria tirar seus alunos, mas eles disseram "Não, não, tudo bem. Eles gostam das suas aulas. Eles realmente parecem estar gostando do que você faz". E, no fim, quase metade das turmas de jujutsu e de judô ingressaram na minha turma.

As turmas foram ficando cada vez maiores e eu não queria ter nenhum tipo de conflito com os outros professores. Percebi que já tinha alunos suficientes para me mudar. O local de judô e jujutso agora é um supermercado, o edifício foi reconstruído, mas onde eu dava aulas talvez até seja hoje a seção de carnes ou algo assim (risos)

AW: O senhor mencionou que Tohei Sensei o ajudou a compreender o significado de ser humano?.

KK: Certo, certo. Ele mostrou as coisas fundamentais: polidez com os demais, respeito, como ver os outros. Antes disso, eu estava preocupado somente em aprender como derrubar as pessoas. Como instrutor, eu acreditava que era isso que as pessoas vinham aprender, mas estava totalmente errado a respeito. .Como Tohei Sensei martelava nesse ponto o tempo todo, parecia que tudo que eu fazia estava errado, e – você sabe – estava errado. Em geral, era a forma que eu pensava sobre mim mesmo que estava totalmente errada. Ele realmente ajudou a construir as bases de quem eu sou , mais do que me ensinar as técnicas Eu fui somente um uchideshi durante dois anos mas eu aprendi muito sobre as bases do Aikido naquela época.

AW: Na sua opinião, qual é o objetivo do Shin Shin Toitsu Aikido?

KK : Eu gosto de ensinar o lado técnico do Aikido. Mas Tohei Sensei disse que a Ki Societe foi criada para fazer da sociedade um lugar melhor. E, por um lado, recebei essa missão quando comecei a ensinar. Quero que meus estudantes façam o melhor, primeiro no tatame. Porém, é possível que as pessoas não captem nada extra, fora das técnicas a partir das quais eu ensino. Mas, se existe algo "certo" a esse respeito – mesmo se apenas uma pessoa compreender isso, ficarei feliz

AW: Muita gente acha que o Taigi na Ki Society é competição e que isso não é bom no Aikido. O que o senhor diria sobre o papel da competição Taigi na Ki Society?

KK: Meu entendimento pessoal é de que o Taigi não foi criado originalmente como competição Tohei Sensei concebeu esse formato como um presente para seus instrutores, para que eles não se "ralassemm" durante uma demonstração.
Na época, a maioria dos estudantes era bastante jovem e ia ao treinamento como quem vai a um campo de treinos militares. Nós aprendemos muito de Tohei Sensei em um curto período de tempo e nos tornamos capazes de fazer as técnicas bastante bem, uma por uma. Mas, em uma situação de demonstração, como a seqüência das técnicas não estavam muito bem "digeridas", tornava-se difícil. Tohei Sensei nos deu uma ferramenta - o taigi – para que a usássemos como uma espécie de guia, para que não nos sentíssemos perdidos. Com esse repertório sob nosso cinto, nos sentiríamos mais confortáveis dando uma demonstração.

As pessoas às quais ele ensinava eram muito apegadas em treinar com ele. Nõs compreendíamos os aspectos básicos bastante bem com ele. Tínhamos a condição de vê-lo fazendo aquelas técnicas em demonstrações e começamos a perceber padrões no que ele fazia. Ele oficializou essas formas um pouco mais tarde. Mais tarde, ele observou seus estudantes cuidadosamente e percebeu que eles não estavam fazendo as formas corretamente. Por isso, é que ele trouxe a idéia de competição para que possamos aperfeiçoar o que estamos fazendo de forma que não fiquemos todos completamente iguais.

Há muito tempo, companhias, como a Honda, ficavam contentes em fazer veículos de passeio para pessoas como eu e você dirigir. Mas, então, elas começaram a introduzir carros de corrida para a Fórmula Um. Isso não foi devido ao desejo delas de tornar seus veículos de passeio capazes de correr em uma velocidade de 200 milhar por hora pela cidade. A intenção, era usar as pistas de corrida como uma espécie de laboratório para criar tecnologias melhores que seriam aplicadas aos veículos de passeio para torná-los mais seguros, mais eficientes e mais ecológicos.

De certo modo, a competição taigi é como as pistas de corrida da Fórmula Um. Os estudantes não estão lá apenas para "vencer" a competição, mas para usá-la como um meio .de aperfeiçoar ainda mais sua técnica Tohei Sensei sempre prestou muita atenção no modo como as pessoas competiam - no que estava funcionando e no que não estava.

A prática superficial nos mostra as pessoas aplicando somente a forma técnica. Mas, através do taigi, as pessoas podem refinar a coordenação corpo e mente.

O que acontece no Taigi não são necessariamente golpes "de rua". Tohei Sensei costuma mostrar esse tipo de coisas – técnicas de prisão ou como lidar com uma pessoa muito agressiva. Isso não é necessariamente o que temos que ensinar, mas para que saibamos, no caso em que tenhamos que ensinar. Nós, como professores, temos que estar preparados para lidar como uma ampla gama de alunos, com diferentes formações. Eu posso ter que ensinar um policial ou um agente prisional. Mas não aquilo, eu penso, que seja necessário ser ensinado a qualquer um. Um policial tem necessidades de aprender coisas que um cidadão comum não tem. Um guarda prisional pode ter restrições no que ele pode fazer, então a ele pode ser ensinado algo diferente.

Em práticas normais, não é necessário focalizar em nenhum modo especial. A prática normal é direcionada, principalmente, para a coordenação de corpo e mente. Mas, há diferenças entre ensinar, digamos, um jogador de baseball e um lutador de sumo. Ensinar esse tipo de pessoas, era para Tohei Sensei uma espécie de hobby pessoal. (risos) Ele não estava ensinando baseball a um jogador de baseball ou sumo a um lutador de sumô. Quando ele tinha tempo e eles lhe fizessem perguntas, ele ensinava a coordenação corpo-mente.

AW: Onde o senhor gostaria de ver a Ki Society daqui a 20 anos?

KK: Oh! Eu espero viver até lá! (risos) .Para enxergar tão à frente, eu teria que voltar 20 anos. Em 1980, ainda era um tempo confuso para a Ki Society. Nõs ainda estávamos tentando nos organizar como instituição. Na verdade, a Ki Society ainda não tinha dez anos naquele tempo, ainda era jovem para uma organização e muitas coisas ainda precisavam ser feitas.

Vinte anos atrás, a Ki Society nos Estados Unidos ainda sofria muita pressão da Aikikai e teve que ficar, de certa forma, na defensiva. De vinte anos para cá, ninguém no Aikido quer dominar, mas coexistir – não misturar. Temos que continuar, cada um com seu estilo. Pelo menos, essa é minha idéia geral sobre qualquer coisa. Por exemplo, se os americanos tentarem misturar a tradição japonesa com o que existe aqui vai ficar confuso, até mal-entendido.
Se os americanos puderem apreciar as raízes da tradição japonesa, mas compreender que há linguagens separadas, daí a gente pode coexistir e comunicar-se. Eu gostaria que com a Ki Society fosse assim. Quem sabe, a gente não vá misturar com qualquer outro estilo, mas sentir-se confortável com nosso próprio estilo, de modo que nos possamos comunicar.
Vinte anos depois – agora - posso ver que nós, definitivamente, temos uma organização muito melhor. .

Se Deus quiser, a Ki Society continuará a melhorar nos próximos vinte anos, em toda a organização da Ki Society, temos apenas algumas milhares de pessoas, nos Estados Unidos. Ainda não é uma grande organização. É muito difícil predizer para os próximos vinte anos. Mas eu penso que embora não fique muito "visivel" para o público, ate lá, irá se integrar bem à sociedade.

A Ki Society agora tem uma mudança de geração acontecendo, também. Todos os instrutores seniores estão envelhecendo. Então, naturalmente, nos próximos vinte anos haverá uma nova geração de instrutores. Por isso, eu acho que as pessoas da nova geração precisam de coisas mais "práticas" do que a geração mais velha. Eu entendo bem a forma pela qual Tohei Sensei fala, mas talvez sua linguagem esteja um pouco antiga para as gerações mais novas. Acredito que a geração de Tohei Sensei tinha alguns ideais em mente e foi em busca deles.. Nós valorizamos todos esse esforço , mas também temos que aplicar seu Ki à nova geração. Penso que isso terá que acontecer porque as gerações estão mudando.

AW: Muito obrigado, Sensei, pela sua atenção

KK: Obrigado.

(tradução Noemi Osna)