segunda-feira, junho 05, 2006

Entrevista sobre Shobogenzo – Soku Shin Ze Butsu 1

Entrevista sobre Shobogenzo – Soku Shin Ze Butsu 1
por Mike Luechtfordem
8/2/2000

O próximo capítulo é Soku-shin-ze-butsu., “Mente aqui e agora é Buda”. Este é um capítulo muito interessante porque a “mente” é central na civilização ocidental. Tendemos a pensar que “mente aqui e agora é Buda” significa que, quando nossa mente está aqui e agora, então somos Buda. Porém o significado real é mais sutil que isso, é o que o Mestre Dogen explica nesse capítulo. O segundo ideograma em chinês “shin” significa coração. Mas em japonês, por exemplo, coração e mente são a mesma coisa. Portanto os japoneses apontam para seus corações quando querem dizer “em minha mente”.

Comentário: Na verdade faz mais sentido para mim. Alguém me disse há alguns anos atrás, acho que quando estava falando sobre os chineses, que havia uma frase sobre esse assunto, você não sabe sobre algo realmente a não ser que você o tenha sentido.

Tudo bem, mas nosso cérebro está na nossa cabeça não é mesmo? Portanto dessa maneira o jeito que os japoneses pensaram sobre o coração ser o centro parece muito estranho. Mas para eles, a idéia de que as emoções estão na sua cabeça lhes parece estranho. No ocidente nós tendemos a separar o intelecto das emoções, eu não estou seguro se esta separação continua a ser válida. Afirmo isso pois a ciência não está totalmente segura sobre quais são as diferenças entre pensamentos e emoções. O que é um pensamento e o que é uma emoção? De qualquer forma, podemos esperar que as coisas possam ficar mais esclarecidas. Eu lerei sobre a introdução do começo deste capítulo:

Soku significa “aqui e agora”, Shin significa “mente”, Ze significa “é”, Butsu significa “Buda”. O princípio do Soku-shin-ze-butsu, ou “mente aqui e agora é Buda” é muito famoso no Budismo, mas muitas pessoas têm interpretado o princípio para sustentar crenças do naturalismo.

“Naturalismo” nesse caso significa o tipo de sentimento que nossa mente está sempre aqui, portanto está tudo bem enquanto estivermos.

Dizem que se nossa mente aqui e agora é Buda nossa conduta deve sempre ser correta., e nesse caso não há necessidade de fazer qualquer esforço para entender ou compreender Budismo.

Comentário: Interpretação do Zen Budismo muito comum na década de 1960 pelos norte-americanos. Um tipo de interpretação de hippies sobre esse assunto.

Sim, a interpretação da geração da moda.

Comentário: Sim, eu não diria isso (inaudível) porque sinto geralmente que há uma interpretação popular (inaudível)

Sim certamente os anos 60 houve um sentimento que está tudo bem enquanto estivermos, como uma reação sobre o forte moralismo cristão, você sabe, nós somos terríveis e tudo mais.

Comentário: Sim, eles usaram algumas citações Zen para suportá-los.

Entretanto essa interpretação é um grande erro. O princípio soku-shin-ze-butsu, “mente aqui e agora é Buda”, deve ser entendido não pelo ponto de vista do intelecto, mas sim pelo ponto de vista da prática. Em outras palavras, o princípio não significa crença em algo espiritual chamada “mente” mas afirma que o tempo “agora” e o lugar “aqui” como realidade propriamente dita. Este tempo e lugar deve sempre ser absoluto e correto, e assim podemos chamar de a verdade ou “Buda”.

Essa introdução dizendo que a mente aqui e agora é Buda significa que estar no momento presente é Buda. Estar presente é Buda, estar aqui e agora é Buda. Então mesmo o Mestre Dogen, como veremos adiante, na verdade cita algumas interpretações erradas da frase soku-shin-ze-butsu que é uma frase muito famosa mesmo antes de nossos tempos, em uma tentativa de conduzir para o que a frase realmente significa.

O que cada Buda e cada patriarca tem mantido e contado com , sem exceções, é somente “mente aqui e agora é Buda”. Entretanto muitos estudantes interpretam erroneamente que “mente aqui e agora é Buda” não existiu na Índia, mas foi primeiramente escutada na China. Como resultado, eles não reconhecem seu erro como um erro. Devido a não reconhecer seu erro como um erro, muitos caem no não-Budismo.

Houveram muitas discussões sobre que partes do Budismo vieram da Índia, e quais partes vieram da China. Houveram muitas discussões sobre quais sutras foram realmente originais do Budismo inicial, e quais deles foram escritos mais tardes. E eu não sei muito sobre isso, mas acredito que o Mestre Dogen está dizendo que houveram pessoas que pensaram que isso era uma nova maneira de interpretar o Budismo. Do mesmo modo que algumas pessoas pensam que Zen é algo que vem do Japão. A palavra “Zen” é certamente algo que vem do Japão , mas a prática é algo que vem do Budismo original.

Quando pessoas estúpidas escutam conversas sobre “mente aqui e agora é Buda”, interpretam que seres comuns, intelectualizam e sentem percepção, que nunca estabeleceram o corpo-mente, apenas são Buda.

Portanto eles pensam que o intelecto e senso de percepção de pessoas comuns que nunca praticaram Zazen estabeleceram o corpo-mente (o corpo-mente significa a mente que atinge a verdade, e mais uma vez temos que ter cuidado com o significado da palavra “mente”.), portanto o que ele está dizendo que muitas pessoas pensam que pessoas comuns apenas são Buda porque suas mentes somente estão aqui e agora.

Isso ocorre por nunca terem encontrado um verdadeiro professor. A razão em afirmar que eles se tornaram não-Budistas é que existiu um não-Budista na Índia chamado Senika., seu ponto de vista é expressado da seguinte forma:
As grandes partes que seguem em itálico é a visão de Senika.

Pergunta: Há uma citação específica ou não?

Eu não acredito. Algumas vezes não podemos rastrear as citações, e nesse caso não fomos capazes de encontrar a origem das citações. Se é uma citação direta ou se é uma recordação literal do Mestre Dogen, mas no Shobogenzo em japonês, está escrito em ideogramas chineses, portanto os colocamos em itálico. Porém de onde vieram não é conhecido. Se pudéssemos encontrar, geralmente é colocado nas observações de rodapé. Eu devo continuar com isso? Irei ler sobre isso porque é uma representação de um ponto de vista errado:

A grande verdade existe agora em nosso próprio corpo, para que assim possamos reconhecer facilmente sua situação. Em outras palavras, (uma inteligência espiritual) diferencia entre dor e prazer, naturalmente sente frio e calor, reconhece desconforto e irritação. (A inteligência espiritual) não é nem restrita por uma miríade de coisas ou conectada com circunstâncias: coisas vêm e vão circunstâncias surgem e passam, mas a inteligência espiritual sempre permanece,
Seria mais como a alma.

sem mudança. Esta inteligência espiritual está em toda nossa volta, permeando toda almas – comuns e sagradas- sem distinção. No seu interior, flores ilusórias no espaço existem pelo tempo,

“Flores ilusórias no espaço” é uma maneira de conversar sobre ilusões ou desilusões.,

mas quando aparecem discernimentos momentâneos e coisas e circunstâncias desapareceram , então a inteligência espiritual, a essência original, é facilmente reconhecida sozinha, pacífica e eterna. Apesar da forma física pode estar quebrada, a inteligência espiritual parte inquebrável ,

em outras palavras, a alma é separada do corpo

como ocorre quando a casa queima no fogo, o dono da casa sai. Esta presença espiritual clara e verdadeira é chamada “a essência da percepção e inteligência”. Também é descrita como “Buda”, e chamada “iluminação”. Inclui ambos o sujeito e o objeto, e permeia ambos desilusão e iluminação. Portanto permite a miríade de Dharmas e todas circunstâncias serem como elas são. A inteligência espiritual não coexiste com circunstâncias e não é o mesmo que coisas. Ela tolera constantemente passando através de Kalpas.

Um “Kalpa”é uma palavra em sânscrito para um grande período de tempo. Eu acredito que é o período de tempo que leva para um anjo gotejar água sobre uma rocha para desgastar a rocha ou algo como isso.

Também podemos chamar as circunstâncias que existem no presente “real”, desde que derivem da existência da inteligência espiritual: como são condições surgidas da essência original, são coisas reais.

Na verdade aproxima-se a Hegel, conclusão final de Hegel.

Mesmo assim, não são eternas como a inteligência espiritual, pois elas existem e desaparecem. A Inteligência espiritual não se relaciona com clareza e escuridão, pois conhece espiritualidade. Chamamos de “inteligência espiritual”, também chamamos de “a própria verdade”. Chamamos como “a base do despertar”, chamamos de “essência original”, e chamamos de “substância original”. Alguém que percebe essa essência original é dito que retornou a eternidade e é chamado um grande homem que retornou para a verdade. Após isso, ele não vagueia mais pelos ciclo da vida e da morte, ele experimenta e entra no oceano essencial onde não há nem aparecimento ou desaparecimento. Não há nenhuma realidade além dessa, mas enquanto a essência original não emergiu, os três mundos e seis estados são ditos que surgirão em competição.

Os “três mundos” e os “seis estados” estão nos rodapés, eles surgiram antes.

Esta é, portanto, a visão do não-Budista Senika.

Portanto é uma visão atrativa mas é uma mera teoria.

Comentário: Seria muito próximo a lógica da yoga, não é?

Comentário: Sim, seria interessante saber o que as palavras em sânscrito são nelas.

No original?

Comentário: Sim, para ver se elas correspondem a palavra (inaudível) naquela filosofia.

Ah sim, o Mestre Dogen não escreveu nenhuma palavra em sânscrito no seu original mas o kanji pode ser rastreado para os significados em sânscrito. Mas não sei o que eles são aqui.

Comentário: Isso é um pouco de discurso retórico não é?

Sim, absolutamente. Mestre Dogen não diz algo a mais do que “esta é portanto a visão do não-Budista Senika”. Ele não comenta nada mais do que isso. Ele prefere ir por uma estória longa, a estória avança a próxima página e talvez devêssemos parar por aqui, não é mesmo? Muito obrigado.

Trad. Kendi Chikude.

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